Por: Willian Yoshikazu Takamura e Altair Gonsalves Nascimento De acordo com dados do Banco Central, o crime de lavagem de dinheiro movimenta cerca de R$ 6 bilhões por ano, apenas no Brasil. No mundo, causa impacto de 2% a 5% no PIB mundial, ou US$ 1 trilhão por ano. Embora o Programa Conheça seu Cliente seja importante para a prevenção deste crime, nem todas as empresas que atuam no ambiente digital o adotam. Características relacionadas à praticidade da internet, e as responsabilidades exigidas quanto à privacidade de dados, contribuem para este quadro. Além disso, a dificuldade para coletar informações, de maneira íntegra e confiável, também é apresentada como um dos problemas. Lei não isenta cliente de forncecer informações É importante dizer que a privacidade de dados não isenta o cliente de fornecer informações, porém, ele deve consentir em repassa-las. Por outro lado, cabe à empresa esclarecê-lo sobre a finalidade acerca do uso. É preciso ressaltar que a proteção de dados pessoais é garantida pela Lei 3.709/2018, também conhecida pela sigla LGPD, a Lei Geral de Proteção de Dados, inspirada pela GDPR (General Data Protection Rule) da União Europeia. A empresa é responsável pela segurança dos dados coletados, e a qualquer momento, a permissão dada por alguém pode ser revogada, se assim o cliente desejar. A Lei também prevê aplicação de multa de até 2% do faturamento da empresa que se envolve em irregularidades durante o processo de tratamento destes dados. Foi criada uma função de Encarregado pelo tratamento de dados pessoais, nas empresas e na esfera pública, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados, bem como um Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais e Privacidade, reportando diretamente à Presidência da República. A lei entra em vigor em meados de 2020, mas nos coloca em patamar de igualdade nas discussões com o FTC (Federal Trade Comission) dos Estados Unidos e das Autoridades de Proteção de Dados da União Européia. “De modo geral, as empresas precisam encontrar equilíbrio entre cumprir a legislação que trata sobre a privacidade dos dados pessoais, e atender às medidas de boas práticas do mercado, que têm como objetivo prevenir fraudes e a lavagem de dinheiro”. E as empresas precisam compreender, que numa era da informação, com todo o fluxo de dados no mundo digital, os dados pessoais são uma valiosa fonte de riqueza, que podem abrir novos mercados, definir novas estratégias ou até mesmo defender a empresa de fraudes e lavagem de dinheiro. Não é uma tarefa simples, por isso, muitas empresas que atuam neste setor não criam o Programa Conheça seu Cliente. E não percebem que o importante não é ter um volume enorme de dados para seus algoritmos de big data e inteligência artificial, mas ter informação confiável, que deve começar por aquela que permite identifica-los de maneira legítima, bem como dados sensíveis, que permitam compreender seus hábitos e comportamentos, auxiliando, assim, nos processos de fraudes e lavagem de dinheiro. No mundo digital, precisamos observar que o Conheça seu Cliente não é apenas para garantir segurança quanto a identificação do consumidor e sobre as suas atividades, mas, também sobre o vendedor num Marketplace, observando se não está negociando algo ilícito, gerando fraudes ou não entregando seus produtos, serviços ofertados. Mas, uma questão que se deve ter em mente, é que toda esta atividade deve ser proporcional aos riscos envolvidos. Um e-commerce que vende sapatos tem um risco muito diferente de um e-commerce que vende eletrônicos de alto valor, ou mesmo um marketplace que pode vender qualquer tipo de produto. Os procedimentos de Conheça seu Cliente devem ser proporcionais à estrutura e risco que a operação apresenta. Normalmente, os impactos são maiores nas empresas de capital aberto, por precisarem prestar contas aos acionistas (e portanto apresentar bons e sólidos procedimentos de Conheça seu Cliente), bem como empresas financeiras, especialmente as que são reguladas pelo Banco Central do Brasil, como disposto na Circular 3.461/2009, em que são obrigadas, inclusive, a informarem ao COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) as movimentações suspeitas. Empresas devem encontrar equilíbrio entre atender à lei e cumprir às boas práticas de mercado Marketplaces, inclusive, começam a ser impactados por estas normas. As regulações de meios de pagamento, do Banco Central do Brasil, como a Circular 3.885/2018 e a Circular 3.682/2013 têm colocado sobre as bandeiras de cartão a obrigação de monitorar o cumprimento dos participantes dos chamados arranjos de pagamento, que além dos tradicionais credenciadores e subcredenciadores, incluíram os marketplaces como equivalentes aos subcredenciadores, obrigando-os a cumprir com normas mínimas de PLD-CFT e KYC. Mas, se por um lado temos uma carga pesada sendo imposta em termos de leis e normas de privacidade de dados e, ao mesmo tempo, de lavagem de dinheiro, isto abre um enorme campo de possibilidades para startups que tenham um olhar e soluções de scoring, identificação e prevenção de fraudes para suportar toda esta carga regulatória e normativa. E isto começa a surgir no mercado com várias fintechs se chamando de regtechs (“Regulatory Technology”), startups que vêm trazer soluções de custo acessível e já adaptadas ao mundo digital para atendimento aos procedimentos regulatórios, incluindo proteger os dados dos clientes que permitem adotar as melhores e mais eficientes práticas de conheça seu cliente no mundo digital. Uma pesquisa de agosto de 2018, levantou que, no Brasil, temos 404 fintechs, e apesar do grande foco em pagamentos (26%), gestão financeira (17%) e empréstimos (17%), temos ainda outras 49 startups de eficiência financeira, categoria que engloba desde regtechs com foco em autenticação, identificação, coleta e análise de dados, e outras atividades relacionadas a Conheça seu Cliente, até ferramentas de fraude, contábeis e jurídicas para dar suporte aos diferentes tipos de negócios. Estamos apenas no começo de uma revolução em que a sociedade percebe seus dados não apenas como uma identificação de si, mas como uma arma que se usada da maneira correta, pode gerar novos negócios, mitigar a ocorrência de fraudes e lavagem de dinheiro e, porque não, gerar um equilíbrio social nunca antes imaginado. Existem riscos, mas as oportunidades estão na mesa para aqueles que tiverem boas iniciativas para colocar em compliance suas empresas, sem perder de vista a prosperidade e o crescimento do negócio. Autor: Altair Gonsalves NascimentoBacharel em Economia com especialização em controladoria e MBA em gestão financeira e riscos. Possui mais de 27 anos de atuação no setor financeiro. É membro certificado pela ACAMS – Association of Certified Anti-Money Laundering Specialists e professor do curso MBA em Gestão de Riscos e Compliance da FECAP. Autor: Willian Yoshikazu Takamura Especialista em regulação de meios de pagamento, PLD/CFT, e gerenciamento de risco.Tecnólogo em processamento de dados pela FATEC-SP, e pós-graduado em finanças e controladoria pela FIPECAFI. Possui 16 anos de experiência nas áreas de controles, Compliance e PLD/CFT.