Para evitar que doações para candidatos em campanhas políticas facilitem a corrupção e a lavagem de dinheiro, instituições financeiras, empresas e eleitores devem tomar alguns cuidados Imagem: Freepik Nas eleições de 2022, os candidatos receberam R$ 1,01 bilhão em doações de pessoas físicas, segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Desde 2015, as doações de pessoas jurídicas a partidos políticos estão proibidas. O objetivo do veto é resguardar a democracia, pois a interferência do poder econômico tende a desequilibrar o processo eleitoral. Empresas podem cobrar favores dos políticos que ajudaram a eleger e contribuições a candidatos e partidos muitas vezes servem para encobrir o pagamento de propina. Apesar da proibição, as doações de pessoas jurídicas a candidatos e partidos políticos ainda ocorrem por baixo dos panos. Em setembro do ano passado, no meio do processo eleitoral, TSE identificou 10.296 situações em que um mesmo candidato recebeu doações de diferentes funcionários de uma mesma empresa, o que sugere que os trabalhadores podem ter sido usados como “laranjas”. De fato, contribuir financeiramente com campanhas eleitorais é um direito do cidadão. No entanto, para impedir irregularidades, eleitores, empresas e instituições financeiras precisam tomar certas precauções. A primeira delas é entender exatamente o que a lei permite. Como contribuir com campanhas políticas? As doações a campanhas eleitorais são regulamentadas pelas resoluções nº 23.607/2019 e nº 23.665/2021 do TSE. Segundo a legislação, pessoas físicas podem doar até 10% dos rendimentos brutos recebidos no ano anterior. Caso esse limite seja desrespeitado, o doador pode ser punido com multa no valor de até 100% da quantia excedente. Contribuições superiores a R$ 1.604,10 só podem ser feitas por transferência eletrônica ou por cheque nominal (a restrição visa a evitar a lavagem de dinheiro). Outra opção é doar por pix ou participar de “vaquinhas eletrônicas” (desde que a administradora do financiamento coletivo esteja cadastrada na Justiça Eleitoral). Também são possíveis doações de móveis e imóveis e prestação de serviços que não ultrapassem R$ 40 mil. Assim como é permitido doar ou ceder temporariamente bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro mediante comprovação de que o doador é proprietário do bem ou responsável pela prestação dos serviços. Pessoas físicas permissionárias de serviço público ou cujos proventos tenham origem estrangeira não podem contribuir. E sim, os valores doados devem ser informados na declaração do Imposto de Renda. Já os políticos precisam ter candidatura registrada, CNPJ e uma conta bancária destinada ao depósito das contribuições. Também devem emitir recibos por meio do Sistema de Prestação de Contas Anual em até três úteis. A legislação exige que todas as doações sejam declaradas à Justiça Eleitoral e informem o nome e o CPF dos contribuintes e o valor da contribuição. A prestação de contas das campanhas fica disponível na plataforma DivulgaCand (https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/). Lá, é possível consultar os valores doados a cada uma das candidaturas que disputam eleições desde 2004 e um ranking dos maiores financiadores de campanhas. Como evitar doações irregulares? Consultor Sênior e Líder Técnico na AML Outsourcing, Lucas Teider alerta que, apesar da proibição, pessoas jurídicas ainda recorrem a “mecanismos que têm o objetivo de burlar as regras e dar aparência lícita a doações que desrespeitam as normas”. Por isso, as instituições financeiras, sejam elas bancos ou empresas de vaquinhas virtuais, devem se manter vigilantes, pois é por esses canais que passam as doações. Lucas recomenda atenção a práticas de PLD (Prevenção à Lavagem de Dinheiro), que incluem cadastro e conhecimento do comportamento dos clientes e o monitoramento de transações financeiras. Instituições financeiras devem saber, por exemplo, quais de seus clientes são PEP (Pessoas Expostas Politicamente) e, consequentemente, podem apresentar comportamento financeiro atípico em períodos eleitorais. No entanto, nem todos os potenciais receptores de doações irregulares estão na lista de PEP elaborada pelo Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras). “Por exemplo: o tesoureiro de campanha de um candidato a vereador talvez não seja tão facilmente identificado como PEP, mas todas as doações vão passar por ele”, diz Teider. Por isso, é necessário consultar listas mais completas, fornecidas por bancos de dados privados, por exemplo. As instituições devem observar não só o comportamento dos potenciais doadores e receptores, mas também sua rede de contatos (familiares, funcionários etc.). Desse modo, é possível identificar situações atípicas. “Doações de valores parecidos vindas de pessoas associadas a um mesmo cliente aparentemente não violam a legislação, mas podem sinalizar uma ação orquestrada para burlar as regras que limitam as contribuições”, explica. Aliás, esse cliente hipotético pode ser um empresário que usa familiares ou funcionários como laranjas. “Doações de valores parecidos vindas de pessoas associadas a um mesmo cliente aparentemente não violam a legislação, mas podem sinalizar uma ação orquestrada para burlar as regras que limitam as contribuições” Os cuidados, porém, não se restringem às instituições financeiras. Empresas também precisam se precaver para que doações legítimas feitas pelos seus funcionários não resultem em dores de cabeça ou suspeitas de irregularidades. Os cuidados são necessários, sobretudo, em companhias cujos colaboradores são engajados politicamente. “Se o perfil dos funcionários é mais ideológico, ativista, recomenda-se que eles sejam orientados a comunicar ao RH doações a candidatos e partidos, por exemplo”, afirma Teider. “Não é necessário dizer para quem nem o valor, apenas avisar. É preciso que fique claro que a empresa não está policiando ninguém, que ninguém será punido ou beneficiado porque doou. Esse cuidado é preventivo, pois todos queremos uma sociedade mais justa e menos corrupta”, completa. Referências: https://valor.globo.com/politica/eleicoes-2022/noticia/2022/08/23/saiba-quais-as-regras-para-doacoes-eleitorais-e-como-acompanhar-quanto-cada-candidato-recebe.ghtml https://oglobo.globo.com/politica/eleicoes-2022/noticia/2022/09/prestacoes-de-contas-dos-candidatos-incluem-seis-doadores-ja-mortos-e-205-inscritos-no-auxilio-brasil.ghtml https://www.tse.jus.br/comunicacao/noticias/2022/Janeiro/eleicoes-2022-conheca-as-regras-para-arrecadacao-dos-recursos https://www.tse.jus.br/legislacao/compilada/res/2019/resolucao-no-23-607-de-17-de-dezembro-de-2019 https://www.tse.jus.br/legislacao/compilada/res/2021/resolucao-no-23-665-de-9-de-dezembro-de-2021