Muito visado, setor imobiliário precisa de diálogo amplo para se atualizar em PLD-FTP Imagem: Adobe Stock “São raras as grandes operações contra lavagem de dinheiro que não descobrem nos ilícitos algum envolvimento com o mercado imobiliário”, diz Edgard Rocha, vice-presidente do IPLD. “Infelizmente, é muito comum que lavadores se aproveitem das fragilidades do setor.” Exatamente por isso, é urgente discutir maneiras de resguardar as empresas – sejam elas construtoras, incorporadoras, corretoras – e aprimorar as práticas de prevenção contra a lavagem de dinheiro e o financiamento do terrorismo. O mercado imobiliário tem suas particularidades, que exigem estratégias de PLD-FT distintas das aplicadas no setor financeiro, mas também foi objeto de diretrizes do Gafi que podem auxiliar na estruturação desse combate. Riscos para o mercado imobiliário estar atento Como em outros setores obrigados, o mercado imobiliário apresenta, por suas próprias características, alguns pontos de vulnerabilidade que os lavadores costumam explorar. Uma delas, por exemplo, é a grande variedade e subjetividade nos valores de transações envolvendo imóveis. Localização, arquitetura, materiais, idade do imóvel, tudo isso entra na conta, mas com pesos às vezes tão distintos que se torna complicado estabelecer um padrão. Isso pode gerar uma brecha para dinheiro ilícito, seja em operações de compra e venda, seja em reformas de imóveis. Aí entra também uma particularidade do setor: a complexidade da negociação. Não só por ela implicar vários agentes, das construtoras aos clientes finais, como também pelo próprio modo de se dar o negócio. Quem vive o dia a dia do setor sabe que há uma variedade de formas de pagamento, de prazos, de acertos e de muitos outros fatores, a partir das necessidades dos clientes. O fato de, em geral, haver um número menor de transações também pode gerar uma complicação. Se comparada a um banco, por exemplo, com o qual um cliente às vezes estabelece dezenas ou centenas de operações num curto espaço de tempo, uma imobiliária ou corretora se encontra muito mais vulnerável caso encaminhe ao Coaf sua comunicação de operações suspeitas. Sua identificação pelo possível malfeitor é imensamente facilitada. Mas a situação talvez chegue ao seu maior nível de complexidade quando entram em jogo transações imobiliárias internacionais. Um relatório recente da Transparência Internacional apontou, por exemplo, que em São Paulo mais de 3450 imóveis pertencem a empresas offshore, muitas delas em lugares como Delaware (EUA), Uruguai ou Ilhas Virgens Britânicas, já utilizados em alguns casos como paraísos fiscais. Isso não implica necessariamente atividades ilícitas, mas será que o mercado imobiliário está equipado e capacitado para fazer essa avaliação com a rapidez, a precisão e a minúcia exigidas? Atualização, tecnologia e diligência – soluções à mão para o setor A essas dificuldades se somam uma normativa relativamente antiga, de 2014, e o fato de ter cabido apenas ao Conselho Federal de Corretores de Imóveis (Cofeci) regular as políticas de PLD-FT para todo o setor – mesmo para construtoras e incorporadoras, cuja atuação difere tanto do dia a dia dos corretores. Na avaliação de Edgard Rocha, no entanto, não se trata de obstáculos intransponíveis. “Há diversos órgãos e instituições que podem participar desse diálogo para auxiliar o Cofeci na estruturação de um ecossistema eficaz de PLD”, diz Rocha. Ele aponta, por exemplo, o Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário (Ibradim), que poderia fazer a mediação entre os aspectos normativos e práticos do setor. Entidades como o Sindicato da Construção Civil (Sinduscon) também teriam seu papel. E pode-se acrescentar ainda que, nesse diálogo, organizações ligadas diretamente à prevenção contra a lavagem de dinheiro têm muito a contribuir. “Do modo como está hoje, o setor imobiliário brasileiro claramente não condiz com as diretrizes do Gafi”, avalia Rocha. “Faltam, por exemplo, parâmetros para as empresas poderem aplicar as avaliações baseadas em risco. O mercado como um todo deveria estar mais diligente.” Segundo o vice-presidente do IPLD, há espaço para se construir um ecossistema forte de prevenção à lavagem de dinheiro. O primeiro passo seria a revisão da normativa, onde o diálogo, liderado pelo Cofeci, com e entre especialistas seria fundamental. Depois se poderia entrar com recursos tecnológicos e capacitação dos profissionais, permitindo a identificação, a comunicação e a prevenção de operações suspeitas. Por fim, o mercado poderia contar com consultorias para casos mais complexos, que exijam uma expertise em PLD. “Com essas ferramentas, mesmo uma transação imobiliária internacional – tão complexa para o padrão de hoje do mercado – pode ser feita com bastante segurança e tranquilidade,” afirma Rocha. Ele lembra que há bases de dados com PEPs internacionais, por exemplo, permitindo uma avaliação baseada em riscos muito mais informada e alinhada às diretrizes do Gafi. “A responsabilidade da regulamentação pode estar com o Cofeci”, diz Rocha, “mas ele não precisa resolver tudo sozinho. Há muita gente disposta a ajudar.” Referências Entrevista de Edgard Rocha à redação. Resolução COFECI no. 1336 de 2014: https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=276697 Relatório da Transparência Internacional: https://www.transparency.org/pt/publications/sao-paulo-does-corruption-live-next-door Artigo IPLD – Tipologia: a intersecção entre o crime de lavagem de dinheiro e a venda de imóveis: https://www.ipld.com.br/tipologia-a-intersecao-entre-o-crime-de-lavagem-de-dinheiro-e-a-venda-de-imoveis/ Autor: Da Redação