Após sofrer críticas por conta de denúncias envolvendo a participação de advogados em desvios de recursos do Sistema S, a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) afirmou que vai regulamentar suas normas de prevenção à lavagem de dinheiro. No ano passado, a Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e Lavagem de Dinheiro (ENCCLA) aprovou onze ações a serem implementadas em 2020 para combater esses crimes. Em nota, a entidade disse que “reconhece que aprimoramentos de medidas de compliance são necessários” e garantiu que “as regras em discussão devem necessariamente proteger o sigilo da relação com o cliente, que é privada, e não pode ser violada”, lembrando que as prerrogativas para o pleno exercício da advocacia são garantidas pela Constituição. Diversos setores estão seguindo regulamentações próprias de PLD-FT, como por exemplo os notários. Agora, a categoria dos advogados está entre as poucas que não criaram normas de autorregulação. Entre as ações propostas pelo ENCCLA, a recomendação III é específica para a classe: Considerando que, dentre as atividades profissionais previstas no artigo 9º da Lei n° 9.613, de 1998, os advogados ainda não possuem uma regulamentação quanto às obrigações previstas na mesma lei; Considerando que o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) é o órgão que tem a competência de regular e fiscalizar os advogados; Considerando a necessidade de compor a obrigação legal com o princípio da inviolabilidade das comunicações entre cliente e advogado; A Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro – ENCCLA recomenda ao Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil que edite regulamentação aos advogados para o cumprimento das obrigações previstas na Lei n° 9.613, de 1998, observado o regime de inviolabilidade e o sigilo nas relações entre o advogado e o cliente nos termos da Lei n. 8906 de 4 de julho de 1994 (Estatuto da OAB). Recomendação pode virar lei Ao mesmo tempo em que ocorre a cobrança, o legislativo se movimenta para garantir que advogados forneçam informações sobre pagamentos que possam constituir indícios de lavagem de dinheiro. O projeto de lei 4516, de 2020, (aqui), apresentado pelo senador Arolde de Oliveira (PSD-RJ), propõe que pessoas físicas e jurídicas prestadoras de serviços de advocacia ou consultoria jurídica estejam sujeitas aos mecanismos de controle e prevenção presentes na lei de prevenção à lavagem de dinheiro (Lei 9.613/98). Na justificação do PL, o senador argumenta que advogados ou sociedades de advogados se enriquecem com dinheiro ilícito, proveniente de crimes praticados por seus clientes. Não raras vezes, esse dinheiro provém dos cofres públicos, o que acaba prejudicando, indiretamente, toda a sociedade brasileira. Como não há normas para seguir, muitos envolvidos “ocultam” conhecer a origem ilícita do dinheiro. A Suprema Corte dos Estados Unidos criou a Teoria da Cegueira Deliberada para ilustrar o papel de um agente que finge não enxergar a ilicitude da procedência de bens, direitos e valores com o objetivo de obter alguma vantagem. Esse comportamento ainda é conhecido por outros nomes, como “Ostrich Instructions” (instruções de avestruz), sendo o avestruz alusivo ao comportamento de enterrar a cabeça na terra para não tomar conhecimento da natureza ou da extensão de um crime. Relatório de Inteligência Financeira para o COAF O objetivo do PL, segundo o parlamentar, é permitir que o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) possa identificar operações que constituam indícios de prática do crime. A lei de prevenção à lavagem de dinheiro estabelece o rol de todas as atividades que sujeitam as pessoas físicas ou jurídicas a fazer essa comunicação ao COAF. Entre as obrigações estão: – a de elaboração de um cadastro atualizado de seus clientes; – manutenção de registro de toda transação que ultrapasse o limite fixado pela autoridade competente;– adoção de políticas, procedimentos e controles internos compatíveis com seu porte e volume de operações; – atendimento às requisições periódicas formuladas pelo COAF; – comunicação de operações e transações que possam constituir lavagem de dinheiro. Ainda de acordo com o redator do projeto, o sigilo e a confidencialidade entre o advogado e o seu cliente não podem servir como salvaguarda para a prática de atos ilícitos. É descartada qualquer intenção de verificar a licitude de bens ou valores utilizados para o pagamento de honorários advocatícios. Eles estariam restritos apenas às informações fornecidas para a preparação da ação, defesa ou elaboração de qualquer outra manifestação jurídica – mas não ao pagamento do serviço de jurídico prestado. Fontes: PROJETO DE LEI N° 4516, DE 2020 – acessado em 21 de setembro de 2020 OAB diz que vai regulamentar normas para evitar lavagem de dinheiro – acessado em 21 de setembro de 2020 ENCCLA define onze ações de combate à corrupção e lavagem de dinheiro para 2020 – acessado em 21 de setembro de 2020 Ações de 2020 – acessado em 21 de setembro de 2020 Edgard Rocha Diretor de Administração e Finanças do IPLD. Advogado graduado em Direito pela Universidade Estadual de Londrina (UEL) com intercâmbio em American Law pela University of Delaware-EUA. Mestrando em Direito Penal Econômico pela Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP).