24/01/2024

Crowdfunding e Financiamento do Terrorismo: Desafios e Recomendações do GAFI

24/01/2024

O crowdfunding, uma inovação global na captação de recursos, tem ganhado reconhecimento por suas promissoras oportunidades. Apenas em 2022, foram registradas mais de 6 milhões de campanhas de crowdfunding em todo o mundo, utilizadas para financiar causas, projetos e empreendimentos legítimos.

Contudo, o crescente sucesso do crowdfunding também atraiu a atenção de grupos mal-intencionados, em especial organizações terroristas. Diante disso, o Grupo de Ação Financeira (GAFI) publicou um relatório que analisa como o crowdfunding pode ser explorado para atividades ilícitas, identificando estratégias para detectar e prevenir o financiamento do terrorismo nessa esfera. O relatório é pioneiro, baseando-se em experiências globais e colaboração com especialistas, acadêmicos e a sociedade civil.

De acordo com o documento, o crowdfunding é reconhecido como um mercado internacional significativo, projetado para crescer nos próximos anos. Contudo, embora a maioria das operações de crowdfunding seja regular, o estudo revela que organizações terroristas, como o Estado Islâmico e a Al-Qaeda, exploram plataformas de crowdfunding para captar fundos. Essa capacidade de atingir rapidamente uma audiência global torna o crowdfunding uma opção atraente para o financiamento do terrorismo.

O relatório destaca quatro principais maneiras pelas quais plataformas de crowdfunding podem ser utilizadas para fins de financiamento do terrorismo:

1- Abuso de Causas Humanitárias, de Caridade ou Sem Fins Lucrativos:

Causas humanitárias, de caridade e sem fins lucrativos podem servir como coberturas eficazes para solicitação de fundos e, em alguns casos, são utilizadas para fins de financiamento do terrorismo. O relatório identifica três maneiras pelas quais essa atividade se manifesta:

  • Indivíduos não afiliados a instituições registradas lançam apelos para causas legítimas, desviando fundos para atividades terroristas.
  • Organizações de caridade lançam apelos legítimos, mas desviam recursos para o terrorismo.
  • Organizações sem fins lucrativos podem ser vítimas de extorsão em ambientes de alto risco controlados por grupos terroristas.

2- Uso de Plataformas ou Sites Dedicados de Crowdfunding:

A diversidade de atividades nessas plataformas dificulta a detecção de práticas ilícitas, exigindo práticas autorreguladoras eficazes. Plataformas especializadas, frequentemente utilizadas por indivíduos banidos de plataformas convencionais, apresentam desafios, oferecendo espaço para atividades ilícitas, incluindo o financiamento de protestos e campanhas políticas.

3- Uso de Plataformas de Mídia Social e Aplicativos de Mensagens:

Plataformas de mídia social e apps de mensagens são fundamentais para campanhas de crowdfunding, conectando usuários globalmente. Contudo, esses canais são estrategicamente explorados por terroristas para divulgar campanhas, recrutar seguidores e fornecer instruções de pagamento. Algoritmos de redes sociais também podem reforçar crenças extremistas ao direcionar usuários para campanhas de financiamento do terrorismo com base em seus históricos de pesquisa.

4- Interação do Crowdfunding com Ativos Virtuais:

A interação do crowdfunding com ativos virtuais, como Bitcoin, apresenta desafios adicionais para investigadores, pois serviços de anonimato podem ocultar a origem dos fundos. No entanto, a conversão de ativos virtuais para moeda tradicional nem sempre é conveniente, e a volatilidade desses ativos também é uma consideração importante para as campanhas de crowdfunding vinculadas ao terrorismo.

Na prática, os terroristas frequentemente utilizam uma combinação de técnicas e métodos. Por exemplo, eles podem criar uma campanha de captação de recursos em uma plataforma especializada de crowdfunding, compartilhar a campanha nas redes sociais e solicitar pagamento em ativos virtuais.

Conforme aponta o relatório, o cenário do crowdfunding provavelmente evoluirá ainda mais, com a introdução de novas tecnologias de pagamento e a proliferação de plataformas online que suportam diferentes tipos de atividades de crowdfunding. No entanto, globalmente, há uma compreensão insuficiente dos riscos relacionados a este setor e, por causa disso, a regulamentação varia de país para país.

Além disso, o crowdfunding baseado em doações, considerado particularmente vulnerável, frequentemente escapa das regulamentações devido à falta de avaliação sistemática de riscos por muitos países, resultando em dados limitados sobre seu uso indevido. A diversidade da indústria e a rápida evolução das tecnologias de pagamento também contribuem para abordagens regulatórias divergentes.

Para enfrentar esses desafios, o relatório recomenda:

  1. Inclusão do Crowdfunding nas Avaliações Nacionais de Risco: incluir o crowdfunding nas Avaliações Nacionais de Risco para melhor compreensão e enfrentamento de seus desafios.
  2. Treinamento e Conscientização: promover ações de conscientização para melhorar a identificação e denúncia de atividades potenciais de financiamento do terrorismo (FT).
  3. Compartilhamento de Informações: estabelecer mecanismos robustos de compartilhamento de informações domésticas e internacionais,  e incentivar a colaboração público-privada para esforços eficazes de PLD-FTP.
  4. Implementação Integral das Recomendações do GAFI: implementar integralmente as Recomendações do GAFI relacionadas a Ativos Virtuais, Organizações sem Fins Lucrativos e serviços de transferência de dinheiro ou valor.
  5. Abordagem Multissetorial: desenvolver estratégias multissetoriais envolvendo autoridades nacionais, setor privado, sociedade civil e academia para mitigar riscos sem prejudicar atividades legítimas.
  6. Monitoramento Contínuo e Adaptação: identificar e compreender constantemente os riscos de FT associados ao crowdfunding.

Em última análise, a conscientização e a ação coordenada são importantes para garantir que o crowdfunding permaneça uma ferramenta legítima de captação de recursos, sem se tornar um meio para atividades terroristas. O relatório conclui fornecendo indicadores de risco, com o objetivo de ajudar entidades a identificar atividades suspeitas e promover a segurança contínua nesse setor em evolução.


Curadoria do IPLD