26/09/2023 atualizado em : 26/09/2023

Lavagem de Dinheiro e Financiamento do Terrorismo no mercado de arte e antiguidades

26/09/2023 atualizado em : 26/09/2023

Como o mercado de artes e antiguidades contribui para a Lavagem de Dinheiro e Financiamento do Terrorismo?

 

O mercado de artes e antiguidades pode contribuir para a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo (LD-FT) devido à sua falta de regulamentação, à capacidade de ocultar a verdadeira propriedade das obras de arte, à transferência internacional de obras, à utilização de intermediários e ao anonimato envolvido em muitas transações. Essas características tornam o mercado atraente para indivíduos e organizações que desejam disfarçar a origem de fundos ilícitos ou realizar transações financeiras obscuras.

Objetos de arte e antiguidades podem atrair preços elevados, ser adquiridos em dinheiro vivo em nome de outra pessoa e ser transferidos discretamente entre pessoas e empresas antes de serem vendidos por dinheiro “limpo”. A facilidade relativa com que pequenos objetos de alto valor, como moedas antigas, podem ser transportados através das fronteiras também os torna atrativos para lavadores de dinheiro e financiadores do terrorismo.

O grupo terrorista Estado Islâmico, por exemplo, financiava parte de suas atividades por meio do contrabando de obras de arte e artefatos culturais roubados, vendendo esses itens no mercado negro internacional. Eles saqueavam museus e sítios arqueológicos nas áreas que controlavam, roubando objetos de valor cultural significativo. Em seguida, vendiam esses itens a compradores no mercado negro, muitas vezes utilizando intermediários para ocultar a origem ilegal dos objetos. Isso lhes permitia obter fundos substanciais para sustentar suas operações e atividades terroristas em todo o mundo.

Quais são as vulnerabilidades de LD-FT do mercado, associadas às obras de arte e antiguidades?

 

Em fevereiro deste ano, o GAFI (Grupo de Ação Financeira Internacional) lançou um relatório abordando os desafios enfrentados pelos países ao lidarem com os riscos provindos da comercialização dos objetos de arte e antiguidades. O documento também destaca a importância de identificar e rastrear esses artefatos envolvidos em Lavagem de Dinheiro e Financiamento do Terrorismo, a fim de auxiliar na sua apreensão e confisco. O relatório também incentiva a cooperação com participantes do mercado, incluindo a oferta de treinamento e o compartilhamento de informações público-privadas pode ajudar a superar desafios investigativos. 

Para facilitar o entendimento dessas vulnerabilidades, podemos elencar alguns pontos principais identificados:

  1. Valor subjetivo e falta de preços de referência: o valor de obras de arte e antiguidades é frequentemente subjetivo e pode ser manipulado, tornando mais fácil a lavagem de dinheiro ao inflar artificialmente os preços.
  2. Uso de intermediários e estruturas jurídicas complexas: a compra e venda de obras de arte frequentemente envolvem uma rede de intermediários, tornando mais difícil rastrear a origem dos fundos. Além disso, o uso de estruturas jurídicas complexas, como empresas offshore e trusts, pode facilitar a ocultação da propriedade.
  3. Transferência internacional de obras de arte: a transferência de obras de arte entre países facilita a movimentação de fundos ilícitos através das fronteiras.
  4. Anonimato e falta de due diligence: compradores e vendedores de obras de arte muitas vezes podem permanecer anônimos, dificultando a identificação de pessoas envolvidas em transações suspeitas. Além disso, a due diligence na identificação de compradores e vendedores nem sempre é rigorosa.

Uso do mercado de arte como investimento: o mercado de obras de arte também é usado como forma de investimento, atraindo investidores que podem buscar lavar dinheiro ou investir fundos ilícitos em ativos tangíveis.

 

Quais são os esforços internacionais existentes para mitigar os riscos de LD-FT com as obras de artes e antiguidades?

 

Existem várias convenções e resoluções com o objetivo de prevenir e abordar o tráfico de bens culturais. Isso inclui a Convenção de Haia de 1954, a Convenção da UNESCO de 1970, a Convenção UNIDROIT de 1995 e a Convenção do Conselho da Europa de 2017. Além disso, resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas (UNSC) desde 2015 identificam o saque e o tráfico de objetos culturais como uma fonte de financiamento do terrorismo, condenando tais atividades e incentivando os estados membros a cooperar na prevenção e combate ao tráfico. 

Ademais, embora os profissionais do mercado de objetos culturais não sejam especificamente identificados nas Recomendações do GAFI, os requisitos de diligência devida do cliente, manutenção de registros e relatórios de transações suspeitas se aplicam a eles, inclusive em transações envolvendo ativos virtuais e prestadores de serviços de ativos virtuais. Isso é relevante, especialmente quando as transações envolvendo objetos culturais incluem ativos virtuais ou quando o próprio objeto é um ativo virtual, como certos NFTs (Non-Fungible Tokens).

 

Como o Brasil tem se posicionado frente a essas questões?

 

O Brasil tem adotado uma série de medidas para combater o contrabando de artes e artefatos culturais. Isso inclui a adesão a convenções internacionais, incluindo a Convenção de 1970 da UNESCO, que proíbe e previne a importação, exportação e transferência ilícita de bens culturais, e a Convenção da UNESCO de 2001 sobre a Proteção do Patrimônio Cultural Subaquático. Atualmente, o país ocupa o 26º lugar na lista de países com maiores índices de furtos e integra o comitê da UNESCO responsável por proteger o patrimônio. Além disso, podemos destacar os esforços para a implementação de uma legislação mais rigorosa, a fiscalização aduaneira, a colaboração internacional, a manutenção de registros de bens culturais, a promoção da conscientização pública e a cooperação com museus e instituições culturais.


 

Curadoria do IPLD

Autora: Maria Luiza Batista

Coordenadora da Curadoria do IPLD. Possui mestrado na linha de pesquisa em Terrorismo e Segurança Internacional, e é formada em Relações Internacionais.