10/01/2019

Entrevista com o Coaf – parte 2

10/01/2019

Nesta segunda parte da entrevista, gravada na sede do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), em Brasília (DF), Joaquim da Cunha Neto, ex-diretor de inteligência financeira e supervisor do órgão, explica a maneira correta de preenchimento dos campos do formulário de comunicação. Além disso, comenta sobre a importância das informações adicionais para a análise dos relatórios enviados pelos bancos comunicantes.

Confira a seguir, a segunda parte desta entrevista.

 

IPLD: Qual o critério que devemos utilizar para preencher os campos: data inicial do fato e data final do fato?

Joaquim da Cunha Neto: Este campo que existe no formulário de comunicação, que diz respeito ao início e término da operação, foi colocado justamente para permitir que o comunicante possa comunicar não somente uma operação, mas a movimentação financeira realizada ao longo de um tempo. Vamos dar um exemplo: uma determinada conta movimenta débitos, créditos, saques, depósitos, pagamentos diversos e, no sistema de monitoramento do banco, não foi detectado uma anomalia na movimentação financeira.  De repente, com o passar do tempo, chega-se à conclusão de que aquele volume fez movimentações de forma expressiva. Que, em visita aquele cliente, chegou à conclusão de que ele não tem giro financeiro ou não vende o suficiente para ter aquela movimentação financeira e, ao analisar aquela conta, especificamente, chegou a uma movimentação atípica. O que fazer? Não é uma operação específica que disse ou que apontou para essa atipicidade, mas a movimentação durante um lapso temporal.

     
    Esses dois “campos”  permitem que o banco comunicante marque ali, aponte quando é que ele está reportando aquela movimentação financeira. A partir de qual momento ele está reportando aquela operação e até que momento termina aquela movimentação.    
     

 

Então, a partir daí, no campo de informações adicionais ele vai poder descrever, mais uma vez, as características desta movimentação, tudo que ele observou de atípico e, a unidade de inteligência financeira tem uma ideia, em campo estruturado, a que período se refere aquela movimentação reportada. Se o caso se tratar de uma operação unicamente, a comunicação deverá ser informada, a data início e a data final como a mesma data.

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IPLD: Os campos “créditos e débitos” se referem a uma transação específica que gerou a suspeita ou devem refletir um somatório de todas as operações à crédito e à débito analisados pela instituição comunicante? 

Joaquim da Cunha Neto: Esta é uma situação dupla. Se a comunicação for sobre uma operação específica, o campo da movimentação será somente débito ou crédito, a depender da característica da movimentação e, o somatório, obviamente, é o valor da operação. Caso seja, sobre a movimentação financeira de uma conta, vale lembrar que uma conta possui créditos e débitos ao longo do tempo e, para a análise de inteligência financeira, é importante não só o montante movimentado, mas o montante à crédito e o montante à débito. Isso permite ao analista uma ideia mais precisa sobre o que está ocorrendo ou sobre a característica da movimentação daquela conta. 

 

     
    A comunicação traz três campos distintos: Valor da movimentação à crédito,valor da movimentação à débito e total movimentado.    
     

 

Isso quer dizer o seguinte, se partimos do princípio que estamos analisando uma comunicação e olhando só para o valor total movimentado, temos que ter presente, que, eventualmente, essa movimentação financeira estará duplicada em relação ao crédito, porque estamos tratando do crédito e do débito, vamos somar a entrada e a saída. É dessa forma que analisamos, do ponto de vista da inteligência financeira. Sendo fundamental, o somatório mais uma vez destas movimentações financeiras feitas ao longo do tempo, desde que não se trate, especificamente, de uma operação singular, única.  

 

IPLD: Quanto às listas de enquadramentos, as marcações estão sendo realizadas de forma adequada? Ou seja, elas refletem, de fato, os indícios detectados?

Joaquim da Cunha Neto: Esta é uma longa história, nós, ao longo do tempo, em que analisamos comunicações e produzimos inteligência financeira, tivemos uma evolução substancial neste item específico. Há um questionamento, uma dúvida do analista de inteligência, se deve somar os enquadramentos com as informações adicionais que, por vezes, não se coadunavam. Este foi um trabalho longo que a gente fez. Recebemos aqui, periodicamente, os bancos comunicantes e as equipes que fazem análises para fins de comunicação. Trazemos essas pessoas aqui, para o Coaf, para conhecerem o processo de produção de inteligência financeira e a importância do conteúdo de uma comunicação e, esse item tem melhorado substancialmente, no qual se busca a compatibilidade entre os enquadramentos, ou seja, sinais de alertas detectados e, informações adicionais que, devem ser complementares, devem explicar esses sinais de alertas. Agora, os sinais de alertas, são muito importantes, porque eles trazem, de maneira formal, quais são os itens, ou, os sinais de alertas detectados, com base na norma do órgão regulador.  No caso do Banco Central, a norma traz 106 sinais.  Ou seja, temos aí uma gama de possibilidades, de apontamentos de sinais de alertas.

 

     
    Conjulgados com estes sinais, vem até a comunicação, o campo de informações adicionais que seria a cereja do bolo, é a explicação do que é que foi detectado, apontado por aquele sinal de alerta.     
     

 

Esse campo de informações adicionais tem uma importância e, eu sempre ressalvo isso, uma importância capital para a análise de inteligência financeira. Mais adiante, posso dizer sobre o nosso processo de análise dessas comunicações, e até a busca de palavras por modelos preditivos são feitas nestes campos específicos de comunicação. Então, o importante é que haja conjugação entre enquadramento e sinais de alertas.

 

IPLD: Em que medidas as listas de enquadramento facilitam ou dificultam as análises de inteligência financeira, uma vez que não existe a possibilidade de enquadramento em tipologias não previstas pelos reguladores?

Joaquim da Cunha Neto: É uma característica da norma do Banco Central e de todos os outros reguladores, há um enquadramento específico, ou artigo, em que permite ao comunicante que, ao detectar uma situação suspeita, ainda que ela não esteja contemplada dentre esses sinais de alertas, ele possa comunicar como “outros sinais de alertas”. Vias de regra, isso já vem contido até na lei 9.613 que diz que: são movimentações que, dadas as suas características, valores e partes envolvidas e formas de movimentação possam em si trazer alguma situação suspeita. Então, há sem dúvida nenhuma, uma possibilidade de comunicar ao Coaf, ainda que não sejam detectados aqueles sinais de alertas. 

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