O cenário dos jogos de azar tem evoluído ao longo dos anos. Diante disso, o 5° Congresso Internacional do IPLD trouxe à tona uma discussão crucial sobre a gestão de riscos e as tendências de compliance em cassinos, casas de apostas e loterias. O painel “Jogo ou Blefe: Gestão de Riscos e Tendências de Compliance em Cassinos, Casas de Apostas e Loterias” contou com a contribuição de três especialistas neste tema: Bernardo Mota, Integrante da Comissão Geral de Loterias do Ministério da Fazenda, Magno José de Souza Santos, Presidente do Instituto Brasileiro Jogo Legal (IJL), e Cristina Swan, Especialista da United Lotteries for Integrity in Sports (ULIS), cada um trazendo uma perspectiva única sobre o tema. Jogos de azar: uma indústria em transformação Para iniciar a discussão, Bernardo Mota destacou a transformação que a indústria de jogos de azar tem passado ao longo dos anos. Por muito tempo, o assunto era considerado um tema delicado devido a características culturais e regulatórias específicas do Brasil. No entanto, é evidente a importância de reconhecer a amplitude desse mercado, que transcende setores como economia, comércio, turismo, esporte e saúde. Nessa linha, Bernardo comentou sobre a necessidade de compreender esse mercado multifacetado e internacionalmente rentável que, se bem regulamentado, pode trazer vários benefícios. Ao observar práticas bem-sucedidas em todo o mundo, vê-se que o Brasil está em um caminho de regulamentação e fortalecimento desse setor, especialmente ao considerar os aspectos críticos de Prevenção à Lavagem de Dinheiro e ao Financiamento do Terrorismo. Essa provocação inicial estabeleceu a base para uma discussão sobre os desafios e oportunidades envolvidos na gestão de riscos e conformidade em jogos de azar, que foi aprofundada no restante do painel. Desafios e oportunidades no mercado brasileiro de jogos e apostas Na sequência, Magno José lançou luz sobre os desafios enfrentados pelo Brasil em relação aos jogos de azar. Segundo ele, embora seja uma atividade econômica legal e regulada em todo o mundo, no Brasil, os jogos ainda são vistos principalmente como uma questão cultural. A singularidade desse cenário é evidenciada pelo fato de que o país detém um recorde global ao liderar a oferta de jogos, apesar das décadas de proibição. Atualmente, o setor movimenta cerca de 200 bilhões de reais, abrangendo diversas verticais, como o jogo do bicho, bingo, máquinas caça-níqueis, loterias, cassinos e apostas esportivas. Magno também destacou o projeto de lei que visa legalizar várias modalidades de jogos. Considerando que questões relacionadas à patologia, lavagem de dinheiro e falta de controle têm sido os principais argumentos dos opositores à legalização, houve uma iniciativa dos legisladores de se engajarem com órgãos de controle, como a Procuradoria Geral da República, o Ministério da Fazenda e o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF), para garantir que a legislação avance considerando diretrizes internacionais, como as Recomendações do Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI). Algumas medidas propostas pelo projeto em discussão são a identificação obrigatória de apostadores, a implementação de um sistema de pagamento cashless, e a notificação ao COAF de prêmios acima de R$10.000. Essas medidas têm como objetivo não apenas prevenir a lavagem de dinheiro, mas também permitir o controle de jogadores com possíveis problemas compulsivos. Além disso, Magno abordou a questão das apostas esportivas, que foram legalizadas em 2018, mas ainda carecem de regulamentação adequada. Como consequência, notou-se uma proliferação de operadoras offshore, de sites de apostas online, e de máquinas de cartão habilitadas para a venda de jogos. Ainda, o patrocínio de casas de apostas a quase todos os principais clubes de futebol brasileiros, mesmo que não ilegal, levanta preocupações sobre a falta de um arcabouço normativo bem definido para a proteção e controle no setor. Perspectiva global de proteção à integridade esportiva A terceira parte do painel foi enriquecida pela perspectiva global de Cristina Swan, representante da United Lotteries for Integrity in Sports (ULIS), ONG criada por loterias europeias e americanas para monitorar e proteger a integridade das competições esportivas e prevenir a manipulação de resultados. Atualmente, a ULIS possui atuação global, monitorando atividades suspeitas 24 horas, 7 dias por semana, em todo o mundo. Cristina abordou as crescentes ameaças das apostas esportivas ilegais e da manipulação de competições, ressaltando a habilidade das apostas ilegais de explorar falhas regulatórias e oferecer métodos de pagamento flexíveis, como criptomoedas. Números alarmantes do relatório do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) mostram que 80% das apostas esportivas ocorrem de forma ilegal, resultando em lavagem de dinheiro de até 1.4 bilhões de dólares por ano. Para combater esse problema, a representante da ULIS indicou estratégias que incluem o desenvolvimento de plataformas de monitoramento, a produção de relatórios de movimentos suspeitos, o compartilhamento de informações com entidades esportivas e a definição de escalas de integridade para torneios e competições. Ademais, ela recomendou a adoção de regras rigorosas de identificação do consumidor, exigindo informações pessoais e formas de pagamento rastreáveis nas casas lotéricas. Por fim, Cristina frisou a importância da colaboração entre os setores público e privado para enfrentar as apostas ilegais e a manipulação esportiva de forma eficaz. Um compromisso coletivo pela integridade O painel sobre gestão de riscos e tendências de compliance em cassinos, casas de apostas e loterias ofereceu uma visão panorâmica da complexidade desse setor em constante transformação, repleto de desafios e oportunidades. A busca por regulamentação e a proteção da integridade esportiva requerem um esforço conjunto, envolvendo setores públicos e privados, para que se possa garantir um ambiente seguro e transparente para todos os envolvidos. Curadoria do IPLD Autora: Ana Luiza Drummond Doutoranda em Relações Internacionais (USP), possui graduação e mestrado em Relações Internacionais e especialização em Direito Internacional.