13/10/2022 atualizado em : 13/10/2022

Mulheres na PLD: Entrevista com Silvia Amélia Fonseca de Oliveira

13/10/2022 atualizado em : 13/10/2022

Nesta entrevista, Silvia Amelia Fonseca de Oliveira comenta a respeito da importância da atuação coordenada (em âmbito nacional e internacional) no combate à corrupção e à lavagem de dinheiro, partilhando, também, um pouco de sua experiência enquanto mulher inserida em um ambiente de trabalho predominantemente masculino. Formada em Direito e Administração de Empresas, realizou mestrado em Relações Internacionais na Universidade Jean Moulin Lyon 3 e atua, desde 2006, como delegada de Polícia Federal. Foi Coordenadora-Geral de Articulação Institucional e Diretora do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional do Ministério da Justiça e Segurança Pública respectivamente de 2017 a 2019 e de 2020 a 2021, dirigindo, mais especificamente, a Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e Lavagem de Dinheiro (ENCCLA).

1. Tendo atuado como Coordenadora-Geral e Diretora do DRCI, como descreveria a atuação da ENCCLA no quadro das organizações que atuam no combate e prevenção à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo?

Existe uma diversidade de órgãos nacionais envolvidos no combate à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrrorismo, sendo a atuação coordenada de todos estes órgãos um grande desafio para a PLD/FTP. Diante deste desafio, surgiu, em 2003, a Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (ENCCLA), que, sob coordenação do DRCI, foi iniciada com o objetivo de promover a articulação entre os diversos órgãos que, de uma forma ou de outra, possuem um papel no combate à lavagem de dinheiro.

2. Qual é a importância da cooperação entre os países no combate à corrupção e lavagem de dinheiro e qual é o papel desempenhado pela coordenação jurídica internacional neste cenário?

A atuação coordenada com os países estrangeiros é fundamental, tanto no fortalecimento dos mecanismos internos da PLD/FTP, quanto para a construção de uma imagem positiva do Brasil perante o mercado internacional – pois não se deve esquecer que um país que demonstra preocupação no combate aos crimes financeiros confere maior credibilidade ao mercado. Sobre a cooperação internacional, posso dizer que possui um papel de suma relevância na repressão dos crimes de lavagem de dinheiro, em especial nos casos em que o fluxo dos bens ultrapassa as fronteiras nacionais. Para que um crime desta natureza seja devidamente reprimido, é preciso que se identifique os valores de origem ilícita presentes em países estrangeiros ou no Brasil, preservando-os (por meio, por exemplo, do bloqueio e congelamento de bens) e, em seguida, restaurando-os ao Estado de origem. É de se imaginar, portanto, que este procedimento exija uma comunicação eficiente entre as autoridades de cada país, comunicação esta viabilizada pelas redes de cooperação jurídica internacional

3. Quais seriam, do seu ponto de vista, os desafios na coordenação interna dos órgãos nacionais responsáveis pela prevenção à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo, e na cooperação internacional, entre as diferentes nações?

O principal desafio para a coordenação interna reside, sem dúvidas, na imensa quantidade de atores que fazem parte do sistema de PLD, devendo-se articular, não somente órgãos em âmbito federal, como também estadual, o que torna a comunicação entre os órgãos bastante complexa. Quanto à cooperação internacional, eu diria que existe, atualmente, uma dificuldade em impor, a todos os países, as medidas adequadas de PLD/FTP – alguns países continuam, por exemplo, a flexibilizar a fiscalização das movimentações financeiras que ocorrem em seus territórios, criando o que chamamos de “paraísos fiscais”. Existe, portanto, o desafio de criar nos países a consciência de que o combate à lavagem de dinheiro não é tarefa individual a cada nação, e que os delitos devem ser combatidos de modo integrado e colaborativo.

4. De que forma o Estado brasileiro pode fazer frente às novas tecnologias que, não raro, são utilizadas para o cometimento de atos ilícitos, como a lavagem de dinheiro e o financiamento do terrorismo?

Novamente, destaco a importância da coordenação entre os órgãos que atuam na PLD/FTP, para que haja a rápida divulgação e atualização dos problemas causados pela criação de novas tecnologias. Penso, além disso, que devemos pensar em formas de modernizar o Estado, de modo que as novas tecnologias sejam encaradas, não como geradora de problemas, mas como possíveis mecanismos de prevenção à lavagem de dinheiro. Nesse sentido, o Banco Central apresentou a criação do real digital como um caminho para impedir que outras moedas sejam utilizadas como mecanismo de lavagem de dinheiro ou financiamento do terrorismo. É importante também que se tente antever de que modo o advento de uma nova tecnologia poderia facilitar o cometimento de delitos. É de se esperar, por exemplo, que a documentação digital flexibilize o controle da autenticidade dos documentos, viabilizando, desta forma, crimes como a lavagem de dinheiro (com a criação, por exemplo, de empresas fantasmas). Em síntese, ao antecipar os possíveis problemas gerados pela criação da nova tecnologia, torna-se mais fácil mitigá-los pela raiz.

5. Qual foi o maior desafio, sendo uma mulher em uma área predominantemente masculina, que precisou enfrentar em contexto profissional?

O maior desafio, mas também uma grande oportunidade, foi a atuação como Coordenadora-Geral do DRCI, e, mais especificamente, na ENCCLA, na qual tive contato com diversos atores que atuam na área de PLD/FTP em âmbito nacional e internacional, incluindo autoridades e representantes de diversos órgãos de bastante importância. Não pude deixar de notar, nesta ocasião, que, de fato, trata-se de um campo predominantemente masculino. Devo acrescentar, todavia, que também tive contato com grandes colegas que atuam na área, provando, desta forma, que as mulheres possuem um olhar peculiar a elas que, com toda certeza, enriquecem e contribuem para a PLD/FTP.


Referências: